O Centro de Estudos da Favela (CEFAVELA-Cepid/Fapesp) concluiu, com sucesso, as primeiras turmas do curso “Participação Popular no Território: como fazer?”, realizado gratuita e presencialmente em parceria com a Secretaria Nacional de Periferias do Ministério das Cidades, com o apoio do Observatório das Metrópoles, em duas localidades diferentes: em Santo André, entre 30 de junho e 4 de julho, e no Rio de Janeiro, entre 8 e 11 de julho. Cada turma contou com a participação de 40 pessoas, lideranças de movimentos sociais, gestores públicos e pesquisadores envolvidos com o tema. A recepção foi tão positiva que o Centro estuda ampliar a realização do curso para outros locais.
“Já esperávamos um curso potente, tanto na turma realizada na UFABC quanto na do Rio de Janeiro, mas realmente nos surpreendemos com as trocas incríveis que as aulas proporcionaram. Conseguimos reunir um grupo muito diverso, incluindo gente de universidade, um público muito estratégico para podermos ter mais pessoas capazes de trabalhar metodologias e mediar práticas participativas, além de integrantes dos próprios territórios, das favelas, e também de assessorias técnicas, e de iniciativas populares diversas vencedoras do Prêmio Periferia Viva”, destacou André Pasti, professor da Universidade Federal do ABC (UFABC), pesquisador do CEFAVELA e coordenador dos cursos.
Segundo ele, as experiências dos dois cursos mostraram que as comunidades querem ampliar seus conhecimentos sobre planejamento participativo. “A possibilidade de fazer alianças estratégicas com o Estado, a atuação com gestores públicos e consultores para encontrarmos brechas para fazer políticas públicas participativas que, de fato, distribuem o poder, foram elementos bastante importantes para a gente, e se tornaram muito evidentes para todo mundo que participou do curso”, acrescenta.
Houve participação de pessoas de vários lugares do Brasil, e, ainda na fase de inscrição, já havia pedidos para a realização do curso em outros Estados. O CEFAVELA está conversando com parceiros para verificar a viabilidade de fazê-lo nas outras regiões do País. O curso foi ministrado por Héctor Poggiese, professor da FLACSO-Argentina e fundador da Rede Latino-americana de Participação Popular em Políticas Públicas, e pelo professor André Pasti.





“O curso buscou disseminar um repertório de metodologias e práticas criadas em processos participativos latino-americanos nas últimas décadas. Em um contexto de fragilidade e ataques à democracia, precisamos recuperar nossas capacidades de promover a participação popular e, para além da vontade política, devemos estar preocupados com as práticas em si, suas metodologias, formas de fazer e organizar processos participativos efetivos”, afirmou Pasti.
O curso abordou a participação popular e cogestão, incluindo as metodologias de: Planejamento participativo; Gestão associada/Cogestão; Informação, consulta e consenso (ICC); Prospectiva participativa; Audiência pública participativa; Consenso intersetorial para conflitos territoriais; Mapeamento participativo para cenários de risco; Conselhos participativos de políticas públicas “sanfona”; Diálogo multilateral; Orçamento participativo; e Redes híbridas “ramo de flores”.
Origem nos movimentos ambientais
As metodologias aplicadas no curso foram sistematizadas pelo professor Héctor Poggiese, que pesquisa e cria essas metodologias de participação cidadã. Além das aulas expositivas, foram realizadas oficinas práticas com a mobilização das metodologias vistas em aula para a solução de um problema.
De acordo com Poggiese, cursos como esse nasceram da demanda de criação de métodos para incorporar a participação dos cidadãos nas políticas e nos programas relacionados às questões ambientais nos anos 1970 e 1980. “Venho me dedicando ao processo de elaboração, experimentação e aplicação de metodologias que implicaram a somatória dos atores às políticas públicas, algo relevante diante do processo de redução do papel do Estado e da eliminação da democracia, que colocam em risco os efeitos da política pública”, comentou.
Diversas ações práticas resultaram de sua iniciativa. Um dos exemplos foi sua atuação, por quatro anos, no Conselho de Planejamento da cidade de Buenos Aires, Argentina, quando teve a oportunidade de aplicá-las. Poggiese também organizou, com alunos, um grupo de transferência de metodologias na América Latina, fazendo a difusão em vários países por meio de cursos, mesas redondas, publicações, programas de rádio. “Esperamos despertar o interesse de governos, pelo menos os locais, e de outros grupos pelo uso da metodologia. No caso do Brasil, a expectativa é ter uma equipe nacional que possa difundir essas práticas”, revelou.
Para ele, uma das grandes vantagens das metodologias apresentadas é possibilidade de se ter grupos atuando conjuntamente, articulando as soluções para esses problemas de forma sistêmica, de modo que as soluções para questões diversas dialoguem entre si. Segundo Poggiese, nas práticas co-gestivas “há uma escola de formação, um lugar de associação entre os atores, uma democratização e uma aprendizagem que cria um tecido sócio-governamental, porque as pessoas trabalharam, planejaram e fizeram a gestão juntos. Quando se vinculam projetos feitos com este método, ainda que o tema seja diferente, todos podem funcionar juntos, se entendendo, porque têm o mesmo método. É uma rede que pratica um modo de decisão.”
A palavra de quem participou
Wellington Moraes França, escritor, professor e secretário executivo da Casa de Cultura Cidade de Deus, no Rio de Janeiro, foi um dos participantes do curso aplicado na capital carioca. “Foi uma experiência acadêmica de alto nível, e um encontro com pessoas incríveis, além da descoberta de que muitos conceitos que nossas lideranças nos movimentos associativistas nos anos 70 e 80 praticavam como revolucionárias já vem sendo, há algum tempo, sistematizadas por acadêmicos e replicadas com uma pegada ao mesmo tempo inteligente, dinâmica e divertida”, disse.
Fernanda Henrique, integrante do Movimento de Defesa dos Moradores de Favelas de Santo André e vereadora na cidade de Ribeirão Pires, foi outra participante do curso. “É extremamente necessário colocar o povo periférico no centro do debate político. Pensar de maneira participativa como planejar uma comunidade é essencial para vislumbrar outro futuro possível, em que a população periférica seja ponto central do debate”, afirmou.
Carolina Lacerda, estudante de mestrado em planejamento e gestão do território da UFABC, também participou do curso. “Viabilizar as soluções passa pela participação das pessoas que vivenciam os problemas, estão presentes naqueles espaços, são a vida daquele território. Vimos várias metodologias e novas práticas para que a participação possa ocorrer de forma efetiva, em cogestão e construção conjunta, não vinda de cima para baixo de forma a levar a uma intervenção no território imaginada e concebida de forma não participativa”, finalizou.
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Sobre o CEFAVELA:
Com sede na Universidade Federal do ABC (UFABC), o CEFAVELA é um Centro de Pesquisa, Inovação e Difusão (CEPID) financiado pela FAPESP e comprometido com o desenvolvimento de pesquisas, formação de recursos humanos, transferência de tecnologia e difusão de conhecimento para a sociedade sobre as favelas, em articulação com diversas instituições, movimentos e organizações sediadas e comprometidas com a agenda territorial das favelas. O CEFAVELA busca, por meio de uma abordagem interdisciplinar e multiescalar, gerar, articular e disseminar conhecimentos para ampliar a compreensão das dinâmicas territoriais das favelas e as formas de reprodução de desigualdades espaciais, bem como dos limites e potenciais de programas e políticas de melhoria desses territórios no contexto urbano contemporâneo.
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