Leonardo Rodrigues Pitas Piqui coordenou eixo de pesquisa, conduzindo um levantamento em mais de 120 domicílios em Heliópolis, onde foi implementada a metodologia.
A segunda Nota de Pesquisa do Centro de Estudos da Favela (CEFAVELA-Cepid/Fapesp) traz uma proposta de metodologia de investigação, caracterização e produção de dados na escala da unidade de moradia em favelas urbanizadas, com foco no ambiente interno das habitações. A metodologia a foi empregada na realização de um projeto de pesquisa intitulado “Favelas urbanizadas em São Paulo: ambiente construído e apropriação no pós-obra”, no qual um eixo específico se concentrava na caracterização das unidades habitacionais. A pesquisa teve a coordenação geral de Rosana Denaldi, vice-diretora do CEFAVELA, e o eixo específico foi coordenado por Leonardo Rodrigues Pitas Piqui, pesquisador do Centro.
A pesquisa de campo na qual se empregou a metodologia envolveu a investigação e caracterização das condições internas de mais de 120 unidades domiciliares de Heliópolis, considerado o maior assentamento de favela da cidade de São Paulo, e que recebeu diversas intervenções de urbanização por parte do poder público ao longo dos últimos quarenta e cinco anos.
O principal objetivo da Nota de Pesquisa CEFAVELA N.2 “Metodologia para a Investigação, Caracterização e Produção de Dados na Escala da Unidade de Moradia em Favelas Urbanizadas” é compartilhar e orientar outros pesquisadores sobre utilização de bases de dados, instrumentos e procedimentos a serem aplicados por cientistas que estudam moradias em favelas. “Queremos, basicamente, contribuir para a compreensão do espaço da moradia como uma dimensão territorial que demanda estudo científico, e apresentar a complexidade de fatores que integram e interagem nesta escala”, afirma Piqui.

No texto, ele descreve tecnicamente os procedimentos metodológicos utilizados na investigação para que sejam aplicáveis em outros trabalhos. Também difunde a produção técnica e científica referente à linha de pesquisa “Dinâmicas e transformações socioespaciais, econômicas e ambientais nas favelas”, proposta pelo CEFAVELA. Como o objetivo era a discussão metodológica, a Nota não traz os resultados da pesquisa feita com as 120 unidades domiciliares, que estão disponíveis em publicação na seção “Relatório de pesquisa” no site do CEFAVELA.
A metodologia propõe um caminho para enfrentamento dos desafios para se abordar o objeto de estudo, no caso conhecer as características e condições do interior da unidade de moradia em favela, desde escolher o território de atuação e selecionar e fazer o treinamento técnico da equipe de pesquisadores até estabelecer uma comunicação local prévia e permanente sobre o levantamento e sistematizar bases e instrumentos de pesquisa.
Os procedimentos utilizados passam pelo bater à porta do morador, estabelecer uma comunicação com ele e realizar o levantamento da construção, através de formulários, desenhos e fotografias. Também é preciso obter a aceitação e ter disponibilidade de tempo dos interlocutores, e coordenar a diversidade qualitativa da amostra de pesquisa tendo em vista a relação da unidade, a moradia, com o seu todo, a favela.
Procedimentos detalhados, aspectos positivos e desafios
Pensando nestes aspectos, Piqui propõe, então, a metodologia que a equipe aplicou em campo, com um guia no qual constam o número de pessoas envolvidas em cada procedimento e o tempo de duração, seguida por uma explicação detalhada de cada um dos dez procedimentos indicados: referências técnico-científicas; abrangência dos dados levantados; interpretação e reconhecimento dos fatores de diversidade; bases e instrumentos de pesquisa; seleção e formação da equipe de pesquisadores; comunicação comunitária local; pré-teste de pesquisa de campo.
No caso dos procedimentos da pesquisa de campo, a metodologia propõe as atividades de: apresentação ao morador; aplicação de entrevista por formulário eletrônico; levantamento métrico-arquitetônico da unidade domiciliar; levantamento fotográfico da unidade domiciliar e coleta da autorização de uso de dados para pesquisa.
Há também a etapa do processamento de dados pós-campo, que abrange as atividades de conferência e classificação das respostas obtidas por formulário eletrônico; conversão do levantamento métrico-arquitetônico manual para desenho digital; elaboração e alimentação de plataforma para banco dos dados métrico-arquitetônicos; e tratamento de dados por correlação dos diferentes instrumentos de pesquisa. Por fim, a metodologia contempla as formas de apresentação dos resultados.
A metodologia e os resultados da pesquisa foram discutidos com docentes de diferentes universidades brasileiras, como a Universidade de São Paulo (USP), a Universidade Federal do Rio de Janeiro (UFRJ), a Universidade Federal de Campina Grande (UFCG) e a Universidade Federal de Sergipe (UFS), durante uma oficina realizada no âmbito do 4º Seminário Internacional de Urbanização de Favelas.
O pesquisador elencou os aspectos positivos e limitações da metodologia proposta. No primeiro caso, ela mostrou capacidade de relacionar a unidade com o seu todo, ou seja, a escala da moradia às dinâmicas do assentamento de favela. A metodologia reconhece o morador como a principal fonte de dados de pesquisa. Quando os resultados foram difundidos para um grupo de moradores, percebeu-se que as inadequações construtivas e manifestações patológicas correspondiam às suas percepções Um impacto imediato na população local foi a mudança na interpretação dos problemas que enfrentam, pois, passaram a enxergá-los como sendo coletivos e não apenas individuais.
Dentre as necessidades de aprimoramento da metodologia apresentada, destacam-se os aspectos manuais da pesquisa de campo, que podem ser melhor informatizados. Os critérios de definição da amostra também requerem um trabalho na elaboração de parâmetros mais precisos e regulares. Ele recomenda que, para pesquisas mais abrangentes, como a investigação da unidade de moradia em diversas favelas de uma cidade ou região, é necessário adotar critérios gerais e, preferencialmente, estatísticos.
Há também a dependência da aceitação dos moradores, o que não pode ser estabelecido de forma prévia. Para responder a este desafio, a nota de pesquisa apresenta diversas orientações sobre a comunicação comunitária local. No formulário de entrevista, devido ao enfoque e às limitações de tempo, não foram abordadas questões relacionadas aos aspectos de saúde e acidentes domésticos ocorridos dentro da moradia, bem como a presença de crianças, idosos e pessoas com deficiência; além de problemas de privacidade e conflitos de uso do espaço doméstico. “Considerando as limitações e as necessidades de aprimoramento, a abordagem demonstrou uma elevada capacidade de reprodutibilidade”, avaliou o pesquisador.
Para acessar a Nota de Pesquisa na íntegra, clique aqui.
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